quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Os véus na dança - texto informativo - Shangrila


Véus e a Dança do Ventre






Precisamos fazer a distinção entre a história antiga da dança com os véus e a história contemporânea. Pensemos sobre os últimos 100 anos. Ambas são importantes mas não parecem correlacionadas.  Não há menção sobre qualquer dança com véus depois dos períodos Grego e Romano no norte da África. A utilização dos véus parece ter vindo novamente a tona apenas no final do século XIX.
É difícil pesquisar esse assunto, pois mulheres dançando com véus é um tema muito popular. Esse tema já foi explorado, usufruído e pesquisado por oportunistas e artistas desde a antiguidade até o presente.
 Dançar com véus tem invocado alternadamente a imagem da modéstia genuína assim como o erotismo acentuado pela nudez. As antigas divindades ascendiam aos céus, desciam até o mundo subterrâneo e por vezes voavam. Esse movimento é descrito na arte por véus flutuantes e algumas divindades também dançavam.
O maior obstáculo para nosso entendimento da história na dança com os véus vem das versões distorcidas da dança, apresentação inapropriada das dançarinas e informações imperfeitas fornecidas por historiadores.  Um exemplo excelente disso foi a dançarina Zourna; seu pai era um árabe tunisiano e a mãe francesa. Ela passou a sua infância na Tunísia, onde aprendeu a dançar. Quando seu marido morreu e sua família perdeu todo o dinheiro, ela se transformou em bailarina profissional para sobreviver. Ela estudou ballet e coreografou peças de “fusão”, misturando dança tunisiana com ballet. Ela recebeu o merecido título de “autêntica”, pois o que ela apresentava dificilmente poderia ser classificado como oriental. Ela ficou famosa, e muitas de suas “interpretações” criaram mitos acerca da Dança Oriental.

No final do século XIX e começo do XX, surgiram diversas fotografias de mulheres dançando com o que pareciam ser lenços ou xales. Muitas dessas imagens eram fotos posadas o que deixava dúvidas acerca de sua autenticidade; poderia ser mais um exemplo do gosto do fotógrafo do que propriamente um documento fidedigno da arte daquela época. Ingleses e europeus eram ávidos compradores dessas provocantes fotografias.
Os fotógrafos descreviam o racismo dos orientalistas, a fantasia machista de como deveriam ser as mulheres dos haréns. Essas mulheres eram claramente exploradas. Acredita-se que pertenciam a famílias simples, mulheres muito pobres, prostitutas, dançarinas e escravas. As famílias de mulheres respeitáveis nunca permitiriam que elas fossem fotografadas. Podemos supor, então, que as pessoas presentes nas fotografias não eram de fato representativas da maioria da população.

Houve realmente numa determinada época danças com véus no norte da África e elas podiam ser divididas em duas categorias: a dança dos lenços e a dança dos xales. Ambas similares em sua natureza, mas com movimentos diferentes de acordo com sua proposta.
A dança dos lenços utilizava um ou ocasionalmente dois lenços. Um lenço era mantido em cada uma das mãos ou ambas compartilhavam apenas um lenço. O lenço ou echarpe era agitado no ar, rodado, enrolado ou trançado. A movimentação era rápida. Algumas dessas danças são representadas até hoje na Argélia, Marrocos e Tunísia.



Havia outras danças apresentadas no Oriente Médio, que também usavam véus. No Azerbaijão, as mulheres usam em sua dança lenços, echarpes e véus para acentuar sua beleza. Enquanto dançam, revelam delicadamente os olhos, o nariz, a face e o tronco ricamente adornado. Além de tudo, é uma forma diferente de usar o véu, pois essas mulheres geralmente o levavam atado a um chapéu ou na cabeça.
As dançarinas da Turquia eram em sua maioria ciganas e conhecidas como “cengis”. Às vezes, dançavam com a ponta do véu – que estava preso à cabeça – na boca, preso pelos dentes.
Outra dança “cengi” utilizava echarpes propondo uma mímica sobre as relações amorosas. Segurando as duas pontas de um sedoso véu entre os dedos, fingiam ser uma tímida virgem ou uma cortesã no exercício da sedução ou, ainda, usavam esse lenço como uma delicada barreira a cobrir o rosto. Às vezes enrolavam um xale de seda colorido em volta da cabeça e do pescoço. Diversas manifestações utilizando o que para nós hoje é o véu.
Na Rússia, as danças ciganas também utilizavam xales, assim como na Espanha, as dançarinas de flamenco usam seus mantons.

A dança com véus como conhecemos hoje, entrou para as apresentações teatrais de dança oriental a partir de 1940. A historiadora Morocco diz que, durante suas viagens ao norte da África e Egito, ao perguntar para as famosas dançarinas egípcias Samia Gamal e Tahia Carioca por que não havia danças com véus, recebeu a seguinte resposta: “não sabíamos da existência de uma dança que utilizasse véus até bem pouco tempo. Nem havíamos ouvido falar em algo desse gênero. O que tivemos de concreto foi na época do rei Farouk. Uma coreógrafa russa chamada Ivanova, por volta de 1940, foi convidada para a corte egípcia para ministrar aulas para as filhas do rei, e ensinou Samia Gamal algo sobre o trabalho com véus, entradas em cena e enriquecimento da elaboração do movimento de braços. Ivanova, por sua vez, parece ter aprendido através de uma dança caucasiana do Marrocos. Ela ensinou outras dançarinas famosas como as gêmeas Jamal. Samia Gamal tornou o véu popular nos teatros egípcios e o apresentou nos Estados Unidos em um filme entitulado Ali Babá e os 40 Ladrões, que foi então exportado para outros países.
O véu foi popularizado e incorporado por outras dançarinas orientais em seu repertório.”
O balé russo adicionou o véu a suas coreografias, talvez emprestando essa idéia do Cáucaso ou de Salomé de Oscar Wilde.
A dança com véus foi popularizada nos Estados Unidos e tem suas raízes na Dança dos Sete Véus, de Oscar Wilde, por intermédio das famosas dançarinas KateVaughan e Lole Fuller e das visões hollywoodianas do antigo Oriente. É bem possível que Hollywood tenha sido influenciada pelos cartões postais da virada do século, que mostravam mulheres semi-nuas, posando como bailarinas de harém. Colorida e sensual, é fácil compreender por que a dança com véu se popularizou.

Em 1950, havia pouquíssimas dançarinas orientais nos Estados Unidos. Podiam ser encontradas apenas em casas noturnas étnicas. Se elas executavam sua dança com véu, era mais por influencia de Hollywood ou de Samia Gamal, do que propriamente um costume trazido do Marrocos.
Pessoas do norte da África e do Oriente Médio não compreendem a dança com véus de hoje. Não trata-se de um strip-tease. Por essa razão, as dançarinas orientais usam os véus por pouquíssimo tempo, ao entrar em cena, e logo os abandonam. “Elas não perdem tempo utilizando-o, já que seu público não o aprecia”, diz Morocco.

De qualquer forma, essa dança muito difícil de ser rastreada, não deixa de ser por isso interessante e encantadora.
Há uma perda de continuidade na história de dança dos véus. Ela parece, desaparece, e aparece novamente. Tornou-se fora de moda no Egito, mas pode ser encontrada na Turquia. Para ter os mais interessantes e elaborados usos dos véus, precisamos observar as bailarinas dos Estados Unidos, Inglaterra ou Europa.
A magia e a sensibilidade de uma bela dança utilizando os véus pode proporcionar uma experiência deliciosa e um banquete para os sentidos...
Texto traduzido do manuscrito The Illusive Veil, de Elizabeth Artemis Mourat.

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